segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

CRISTIANISMO: A VITÓRIA DA INTELIGÊNCIA SOBRE O MUNDO DAS RELIGIÕES

Joseph Ratzinger
Tradução encontrada em  http://www.angelfire.com/ult/bentoxvi da conferência ministrada
na Sorbona de Paris no dia 27 de novembro de 1999. Confira o mesmo endereço para outras
traduções inéditas.
Ao final do segundo milênio, o cristianismo encontra-se, no próprio lugar da sua difusão originária, na Europa, em crise profunda, baseada na crise da sua pretensão à verdade. Esta crise
tem uma dupla dimensão: em primeiro lugar, perguntam-nos com insistência cada vez maior se
é certo, no fundo, aplicar a noção de verdade à  religião; em outras palavras, se é dado ao homem conhecer a verdade propriamente dita sobre Deus e as coisas divinas. O homem contemporâneo reconhece-se muito melhor na parábola budista do elefante e dos cegos: uma vez, um
rei da Índia do Norte reuniu num lugar todos os habitantes cegos da cidade. Em seguida fez
passar um elefante diante deles. Deixou que uns tocassem na cabeça, e disse: «Um elefante é
assim». Outros puderam tocar na orelha ou na presa, na tromba, nas costas, na perna, no traseiro, nos pelos da cauda. Depois disso, o rei perguntou a cada um deles: «Como é um elefante?».
E, conforme a parte que tivessem tocado, respondiam: «É como uma cesta trançada...», «é como um vaso...», «é como o cabo de um arado...», «é como um depósito...», «é como uma coluna...», «é como um morteiro...», «é como uma escova...». Então - continua a parábola – come-
çaram a discutir, aos berros: «O elefante é assim», «não, é assim», se atiraram uns sobre os outros e trocaram pancadas, para grande divertimento do rei. A disputa entre as religiões parece
aos homens de hoje como essa disputa entre cegos de nascença. Porque diante do mistério de
Deus nascemos cegos, ao que parece. Para o pensamento contemporâneo, o cristianismo não se
acha absolutamente numa situação mais favorável em relação às outras religiões, pelo contrário:
com a sua pretensão à verdade, parece ser particularmente cego diante do limite de todo nosso
conhecimento do divino, caracterizado por um fanatismo particularmente insensato, que incorrigivelmente toma pelo todo a parte tocada na sua própria experiência.
Esse ceticismo generalizado em relação à pretensão à verdade em matéria religiosa é ulteriormente reforçado pelas questões que a ciência moderna levantou no que se refere às origens e
aos conteúdos do cristianismo. A teoria da evolução parece ter superado a doutrina da criação,
os conhecimentos que se referem à origem do homem parecem ter superado a doutrina do pecado original; a crítica exegética relativiza a figura de Jesus e coloca pontos de interrogação sobre
a sua consciência filial; a origem da Igreja em Jesus parece duvidosa, e assim por diante. O
"fim da metafísica" tornou problemático o fundamento filosófico do cristianismo, os métodos
históricos modernos colocaram as suas bases históricas sob uma luz ambígua. Assim, é fácil
reduzir os conteúdos cristãos a símbolos, não lhes atribuir nenhuma verdade maior do que a dos
mitos da história das religiões, considerá-los uma modalidade de experiência religiosa que deveria colocar-se humildemente ao lado das outras. Neste sentido, pode-se ainda - ao que parece
– permanecer cristão; continuamos a nos servir das formas expressivas do cristianismo, cuja
pretensão, porém, é radicalmente transformada:  aquela verdade que fora para o homem uma
força imperiosa e uma promessa confiável passa a ser uma expressão cultural da sensibilidade
religiosa geral, expressão que seria óbvia para nós em razão da nossa origem européia.

Leia mais: http://padrepauloricardo.org/wpcontent/files_mf/1272102365A_vitoria_da_inteligencia_sobre_omundo_das_religioes.pdf

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